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A importância dos videogames para a saúde mental

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por Carla Rodrigues

Durante a pandemia do novo coronavírus, algumas ações cotidianas se reinventaram e ganharam novos significados. Além da saudade da simples caminhada até o ponto de ônibus, da ida ao barzinho com os amigos no final do dia ou de visitar o cinema nos finais de semana, os jogos eletrônicos também ganharam um apreço especial. Os videogames, antes da crise global, poderiam ser vistos por muitos como uma forma de distanciamento, que isolava os jovens em seus quartos, na frente do computador ou da televisão. Enquanto isso, esses jogadores apaixonados, mergulhados naquele mundo de pixels e aventuras fantásticas, se comunicavam com outros jogadores ao redor do mundo, sem nunca terem se visto pessoalmente. Agora, esses mesmos jogos servem como uma poderosa ferramenta de aproximação entre amigos, familiares e até desconhecidos, que buscam ao máximo o contato social que tinham antes do isolamento.

Uma prova do quanto a população está aderindo cada vez mais este tipo de diversão é o número crescente de acessos a sites de jogos e downloads de games mobile, que cresceram cerca de 30% nas lojas de aplicativos. Segundo o relatório divulgado em março pela desenvolvedora de jogos brasileira Onrizon, os acessos ao jogo Gartic cresceram 1600% desde o endurecimento das medidas de distanciamento social. O game é bastante simples: em rodadas curtas ordenadas de acordo com o número de participantes, um jogador precisa desenhar a palavra sorteada para ele pelo sistema, enquanto os outros colegas, em tempo real, precisam adivinhar o que o artista da vez está desenhando. O jogo tem um acesso gratuito e fácil, que pode ser feito direto no site da plataforma ou nas lojas de aplicativos em smartphones. Além disso, o sucesso do game se deve também à opção de criar uma sala privada e jogar somente com seus amigos convidados, dando um ar de normalidade à rotina solitária que a pandemia obrigou o mundo a viver.

Na internet, ao longo dos anos, diversos jogos cooperativos foram surgindo. Além de Gartic, jogos como Stopots – que relembra o clássico jogo de infância stop – e Habbo – um hotel virtual onde jogadores criam os seus personagens e vivem uma “vida paralela” do jeito que preferirem – fizeram sucesso após os seus lançamento e estão sendo revisitados no período atual. Esse tipo de experiência pode ser a principal diversão dos que não costumavam jogar normalmente, sendo games de fácil acesso e jogabilidade, servindo apenas para animar um grupo de amigos ou colegas de trabalho. 

Para esses novos jogadores, os games podem servir como uma alternativa ilimitada de diversão, ocupando algumas horas do dia que antes podiam ser aproveitadas com a prática de outros hobbies mais tradicionais, como literatura e culinária. Por outro lado, essa forma de entretenimento continua sendo cada vez mais importante para quem sempre esteve por dentro dos jogos online. Para os que cresceram com joysticks nas mãos e pilhas de CDs no armário da TV, a visão sobre os jogos não parece ter mudado tanto. Muitos jovens encaram a realidade de se manter em casa na maior parte do tempo livre como algo mais do que normal, como explica o estudante de publicidade e propaganda Lucas Paties, de 21 anos. Lucas conta que sua rotina não mudou muito, mas que o contato frequente com outros jogadores tem sido uma grande ajuda para não se abalar nesse momento conturbado. Ao longo de muitos anos, o jogador amador gaúcho foi cultivando diversas amizades virtuais, com quem se comunica praticamente todos os dias. “A questão não é nem tanto os jogos em si, mas sim o contato que eu tenho com meus amigos. Lógico, a gente joga jogos juntos, mas o jogo em si não é tão importante. Tem vezes que eu só vou ali, entro na chamada com eles e fico conversando. Essa questão de tu poder conversar com alguém é o que mais me ajuda a aguentar a quarentena”.  

Em seu quarto, Lucas mostra seu equipamento adquirido ao longo dos anos
Foto: Lucas Paties/Arquivo pessoal
Em seu quarto, Lucas mostra seu equipamento adquirido ao longo dos anos
Foto: Lucas Paties/Arquivo pessoal

Além de Lucas, os games também estão ajudando Felipe Fraga, 27 anos, que trabalha com tecnologia da informação. De acordo com ele, a soma da sua rotina de exercícios regrada, alimentação saudável e contato social com outras pessoas por meio de videogames tem tornado esse período mais fácil. Para ele, livros e séries não estavam sendo uma boa forma de entretenimento, já que não se sentia pertencente às histórias que estavam diante dele. Por isso, além do que já jogava normalmente, Felipe tem passado horas se divertindo com World of Warcraft, um game que marcou sua adolescência. “Como é um jogo longo, com muitas coisas para fazer, passo bastante tempo entretido com a história, mas agora como participante ativo, e não somente como espectador”. A questão de contato social também impacta positivamente Felipe, que fica entusiasmado em ter conhecido pessoas de diferentes partes do mundo, mas com o mesmo objetivo que ele durante aquelas horas de diversão. 

E para quem não tem tempo livre ou não quer jogar, uma nova tendência vem se tornando extremamente popular ao longo dos anos: as livestreams de gamers. Jovens movimentam comunidades inteiras somente com um computador, um microfone e uma câmera, jogando e conversando com seus espectadores por meio de plataformas como Facebook, Youtube e a mais famosa entre os jogadores, a Twitch. Os streamers, como são chamados os jogadores que transmitem suas jogatinas ao vivo na internet, conseguem ter isso como uma forma de ganhar dinheiro em tempo integral, por meio de lives diárias de várias horas de duração, sempre em contato constante com o público. “É isso que eu gosto: estar em meio à comunidade que gosta do mesmo streamer que eu, rir enquanto ele não consegue passar de determinada fase ou ajudá-lo com dicas no bate-papo. Às vezes eu nem olho o que se passa na tela, só fico ouvindo eles jogarem para me sentir menos sozinho”, diz Lucas, que acompanha diariamente lives na plataforma Twitch. 

Além das lives de jogadores amadores, há também as de times profissionais competindo em campeonatos de e-sports. Esse tipo de competição reúne milhares de espectadores em arenas gigantes, todos assistindo aos seus jogadores favoritos na frente do computador, dividindo o palco com os telões que transmitem a partida em tempo real. No Brasil, o maior campeonato de e-sports é o Campeonato Brasileiro de League of Legends, ou CBLoL, que em 2019 atingiu a marca de 300 mil espectadores durante a sua fase final, transmitida ao vivo da arena para o Youtube e Twitch.

Uma grande fã desse tipo de campeonato é a estudante de economia Júlia Coutinho, que divide suas horas entre os estudos e a paixão pelos games. Júlia conta que agora, durante a pandemia, sua universidade paralisou completamente as aulas, então precisa de alguma coisa para se entreter durante o dia. Com a falta dos jogos de futebol, a jogadora tem assistido frequentemente a campeonatos de e-sports, como os de League of Legends e Counter Strike: Global Offensive. “Eu tenho amigos que nunca jogaram LoL (League of Legends), mas que estão acompanhando o CBLoL. Basicamente, graças aos jogos nós temos uma maneira de socializar e nos entreter durante esses tempos difíceis”, conta a jogadora. Além disso, Júlia compartilhou que está se aventurando em descobrir novos games e revisitar os que faziam parte da sua infância, como o jogo da Disney ToonTown, desativado há anos pela empresa, mas recriado por jogadores ao redor do mundo que sentiam falta da plataforma. 

Na foto, Júlia aparece em seu quarto, jogando com o notebook no colo
Foto: Júlia Coutinho/Arquivo pessoal

Atualmente, os canais fechados de televisão viram essa nova tendência como um ótimo negócio: canais de esportes como a ESPN e SporTV vêm reprisando campeonatos de jogos eletrônicos ou transmitido lives de jogadores competindo em suas próprias casas, com oponentes a quilômetros de distância. Agora, mais do que nunca, os jogos são importantíssimos para a saúde mental e interação social da população. Diferente do que se pensava, a união proveniente dessa forma de entretenimento não vem somente por meio de um jovem sentado sozinho em frente a um videogame, mas sim de diversos corações que se movem por diversos canais, mas com a mesma paixão: os games. 

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