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Agência HUB Cultura Reportagem

250 Anos, Milhões de Histórias: Todos os Caminhos Levam ao Mercado

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Fachada do Mercado Público. Fotografia: Estephani Azevedo 

Localizado no Centro Histórico de Porto Alegre, o Mercado Público é parte do patrimônio histórico e cultural da cidade. Inaugurado em 1869, se tornou um ponto de referência na cidade e de convergência de muitas vidas. É nesse cenário que diversas histórias se desenvolvem, muitas vezes por décadas, em bancas passadas de geração em geração. Entre elas, é possível encontrar a de Cláudia e de Valdir, que têm uma forte conexão com o local. 

  Com amor, nasce uma tradição

É com grande carinho que Valdir Sauer, atual proprietário da Sanremo Carnes, fala sobre o Mercado Público. Ele conta que gostaria de ter estudado Educação Física, mas “não deu pra conciliar trabalho e estudo”. Apesar disso, não se mostra arrependido – pelo contrário, deixa claro que gosta de trabalhar ali, na loja localizada nas bancas 18 e 19, próximas a uma das entradas do Mercado. 

Valdir Sauer, proprietário da SanRemo Carnes. Fotografia: Estephani Azevedo 

Quanto a seu trabalho na loja, o gaúcho conta que, além de ser proprietário, também gosta de atender no balcão. Revela que tem uma boa relação com os clientes, tanto que conhece muitos pelo nome, e que “brinca, fala de futebol”; conhece muita gente, mesmo que só de passagem. 

Há 19 anos no açougue e 43 no Mercado, Valdir conta que o prédio costumava ser muito mais movimentado antes do incêndio que assolou o local em 2013. Com a pandemia da Covid-19, as coisas pioraram ainda mais. “A gente espera que, aos poucos, comece a voltar [o movimento de antes]. Agora, já foi liberado as máscaras, então o pessoal perde aquele medo de vir ao Centro”. 

Fachada da SanRemo Carnes. Fotografia: Estephani Azevedo 

Natural de Progresso, município com 6 mil habitantes no interior do Rio Grande do Sul, o comerciante diz que ainda sente saudades e que herdou a propriedade que era de seu pai na cidade natal. Apesar de muito feliz com sua atual realidade em Porto Alegre, o sentimento de nostalgia ao pensar em sua cidade persevera – combinado com o amor pelo prédio localizado aqui na capital. 

Sobre sua história no Mercado Público, Valdir lembra que começou trabalhando na banca 17, que era de seu irmão, e que, com o tempo, foram surgindo oportunidades. Hoje, divide o local de trabalho com dois de seus filhos, que começaram a trabalhar ali desde muito cedo e atualmente administram o local. O Mercado é tão especial para Valdir que ele chega a dizer que, quando precisou passar quatro dias em casa em razão de uma lesão na coluna, “não aguentava mais, queria vir trabalhar”. 

Resumindo sua relação com o local, o comerciante diz, com simplicidade:

“O Mercado para mim é tudo!” 

Com amor, segue um legado

De forma semelhante, foi graças a uma das convergências provocadas pelo Mercado Público que Cláudia Di Paoli se tornou a atual responsável pela Banca 1, uma Flora – loja que vende artigos religiosos. Quando questionada sobre o Mercado, ela declara com orgulho e brilho nos olhos: “Eu nasci graças ao mercado!” 

Cláudia di Paoli, responsável pela Banca 1, a mais antiga do Mercado. Fotografia: Estephani Azevedo 

Seus pais vieram de diferentes cidades do interior do Rio Grande do Sul para trabalhar no Mercado: a mãe veio para a banca dos tios e o pai para a de um primo. Naquele prédio, acabaram se conhecendo, formando uma família e construindo uma vida juntos. 

Ambos trabalhavam em bancas diferentes, até que, em 1986, Dona Ernestina, a antiga dona da Banca 1, resolveu vendê-la pois não possuía herdeiros. Seu Lionel, pai de Cláudia, se interessou muito pelo negócio, porém a antiga proprietária tinha uma condição para fechar a venda: a loja deveria permanecer no mesmo ramo de artigos religiosos. 

De início, Seu Lionel negou, pois não tinha experiência e nada sabia sobre o assunto, o que fez Dona Ernestina recusar a venda. Contudo, a história mudou devido a insistência do comerciante, como conta Cláudia: 

“Meu pai realmente queria muito, então ela disse assim: ‘Seu Lionel, pelo menos até eu falecer, depois o senhor muda o ramo.’  Ela já estava com uma idade avançada, então ele decidiu abraçar a causa!” 

Seis anos se passaram, seu pai aprendeu “na marra” e, de maneira inesperada, começou a gostar de trabalhar com pessoas e itens de diferentes religiões. Paralelamente, Dona Ernestina veio a falecer e, felizmente, teve seu desejo realizado – uma vez que a família optou por não alterar o nicho da banca e nele se mantém até hoje.  

Banca 1. Fotografia: Estephani Azevedo 

Em 2000, Lionel decidiu se aposentar, então Cláudia entrou na cena da loja. Inicialmente, ela estudou para ser professora e se formou em Pedagogia; entretanto, quando o pai resolveu que a rotina de 12 horas de trabalho já se tornava exaustiva, Cláudia topou ajudá-lo por um tempo, unindo o útil ao agradável – ganhar um salário maior e dar assistência ao pai. Assim, se passaram 22 anos e a vendedora se apaixonou pelos produtos que comercializa, construindo um laço muito grande com o ponto histórico. 

 “Nosso Mercado é o coração de Porto Alegre! Eu sou suspeita de falar, porque, como eu disse, eu nasci graças ao mercado; mas ele é lindo, acho ele tudo de bom, adoro, amo de paixão! Apesar de dizerem que tem cheiro, tem isso, tem aquilo… eu amo!” 

Cláudia também conta, com muito carinho, do relato de uma cliente que a emocionou: uma mulher que costumava dizer à sua filha pequena que, caso um dia ela viesse a se perder em Porto Alegre, bastava perguntar a alguém onde fica o Mercado Público – qualquer pessoa reconheceria o local e elas se encontrariam lá. A vendedora ainda complementa:  

“Mercado é ponto histórico, né? Pra todo mundo que vem conhecer Porto Alegre, obrigatoriamente tem que passar no mercado, não existe vir ao centro e não vir ao Mercado.” 

Ao precisar definir Porto Alegre em uma palavra, a reação de Cláudia foi imediata: “Só uma?” Mas, após uns segundos de reflexão, falou com certeza:  

“Gratidão! Sou muito feliz de viver aqui.” 

Edição, Redação, Entrevistas e Fotografia: Cláudia Vilemar, Estephani Azevedo, Leonardo Reckziegel, Luiza Pavim, Mariana Haubert, Vinícius Goulart

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