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2020-2 Blog de Papel Reportagem

Visibilidade lésbica: a importância de falar sobre ela

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Por Martha SCHOEN.

Você alguma vez já teve que lutar pra conseguir ser respeitado por quem você é? Todos os dias mulheres lésbicas sofrem os mais diversos tipos de violência. Se quer que o mundo se transforme num lugar melhor para todos nós vivermos em paz e harmonia, comece por você, que tal exercitar a sua empatia aprendendo sobre a realidade das mulheres lésbica brasileiras? Afinal, a empatia é a arte de se colocar no lugar do outro para transformar o mundo, segundo o filósofo australiano Roman Krznaric. 

No Brasil, há um dia criado especialmente para pautar a visibilidade lésbica. O Dia Nacional da Visibilidade Lésbica é uma data estabelecida no Brasil criada por ativistas lésbicas brasileiras e dedicada à data em que aconteceu o 1º Seminário Nacional de Lésbicas – Senale, ocorrido em 29 de agosto de 1996.  

“Dia 29 de agosto foi dia da visibilidade lésbica, que é quando a gente tenta trazer mais foco pra nossa causa, mais foco pra essa comunidade LGBTQIA+, mas a gente constantemente acaba sendo a sigla esquecida ou menosprezada”. Para Beatriz de Lima Vieira, mulher lésbica que ocupa o cargo de Analista de Experiência do Consumidor, de 22 anos de idade e moradora do estado de São Paulo, esse fato se deve ao machismo estrutural, pois as pautas desempenhadas por mulheres têm que ter de lutar duas ou três vezes mais pra conseguir algum reconhecimento. Para ela, infelizmente não há visibilidade nos outros dias e meses que ocorrem após o 29 de agosto, ou pelo menos, essa visibilidade não tem o foco necessário e fica como quase nula. Apesar disso, Beatriz tem esperança de que isso mude, porém não enxerga a luta da mulher lésbica tendo destaque ou notoriedade, muito menos no que diz respeito às conquistas realizadas. 

“A gente ás vezes tem que falar um pouco mais alto pra conseguir ser escutada, pra ter a nossa causa considerada por alguém. A gente enfrenta não só o preconceito com a comunidade LGBTQIA+, mas a gente também enfrenta o machismo, que é complicado, pois a pior parte do machismo que a gente tem que enfrentar é o estrutural e vindo de minorias.” 

Beatriz de Lima Vieira

Para Tainá da Silva, mulher lésbica e profissional jornalista de 25 anos de idade, moradora de São Paulo, essa visibilidade lésbica também não existe nos outros dias após o 29 de agosto. “A gente não vê nossas histórias na TV, nos jornais. E quando vemos, são casos de lesbofobia. Nossos corpos existem e são plurais. É essa a visibilidade que eu procuro, antes de tudo, eu quero existir e quero que as outras mulheres também existam.” 

Porém, para Juliana Hita, mulher lésbica e estudante de 23 anos de idade, moradora do estado de São Paulo, a questão da visibilidade lésbica vem sendo discutida mais amplamente nos últimos tempos. “No meio em que eu estou inserida, pelo menos, na universidade pública com pessoas de classe média, a gente discute bastante sobre isso, mas eu não vejo tanto essa discussão chegar em outras esferas. Acho que a gente tem que começar a pensar em como levar esse assunto pras pessoas que não fazem esse tipo de reflexão, não pensam sobre isso, enfim”. 

Essa discussão precisa ser mais aprofundada e inclusiva, abordar assuntos mais sérios como, por exemplo, sobre a empregabilidade das mulheres lésbicas, afinal, Juliana pontua que raramente percebe mulheres em cargos de alta liderança, e dificilmente encontra mulheres lésbicas ocupando estes cargos. 

A MILITÂNCIA LÉSBICA: O QUE JÁ FOI CONQUISTADO E O QUE AINDA FALTA SER DEBATIDO NA SOCIEDADE BRASILEIRA?  

O dia do orgulho lésbico (19 de agosto) e o dia da visibilidade lésbica (29 de agosto) foram instituídos depois de ações feitas pela militância. Para Tainá, ainda há muito o que ser conquistado, principalmente no âmbito das políticas públicas, de saúde sexual, empregos, maternidade. Afinal, são questões importantes e que ainda carecem de atenção, pontua ela. 

“É comum a gente entender que o L da sigla LGBTQIA+ é apagado ou as vezes não ganha o destaque que poderia receber. Hoje o que precisa mesmo rolar em debate com todo mundo, é a gente entender que existe sim essa parcela dentro da comunidade, que é uma parcela grande pra caramba, e que são pessoas ali que estão lutando pra ser reconhecidas, pra que consigam lutar pela nossa aceitação, pela nossa normalização, pra mostrar que a gente não é um produto da indústria pornográfica pra oferecer satisfação pra um homem, não!” 

Beatriz de Lima Vieira

REPRESENTATIVIDADE LÉSBICA NA MÍDIA 

Tainá ressalta que a representatividade é pouca, que existem algumas produções audiovisuais que abordam as vivências lésbicas, mas muitas vezes são histórias que terminam com finais trágicos. 

Para Beatriz, a representatividade da mulher lésbica na mídia é uma questão complicada por causa dos estereótipos, pois durante muito tempo foi propagado na mídia que a sapatão vai ser a menina de cabelo curto, que escuta MPB e toca violão, que não performa feminilidade, e só se dá bem no meio dos moleques. E não é assim, não necessariamente. 

Beatriz questiona: “Por que uma mulher lésbica tem que ser assim? Quem disse que a mulher só vai ser lésbica se ela seguir esse estereótipo de ser quase um “homem”, ou performar atitudes que são ligadas e que a sociedade impõe como um comportamento masculino? Não! Obviamente não.” E mais, para ela, não é a roupa da mulher, e nem o jeito que ela age, não é o círculo social dela, nada disso tem o papel de definir a sexualidade da mulher. Pois essas associações vêm de uma cultura que foi imposta para as mulheres. 

“É muito foda a gente ligar a televisão pois, de certa forma, hoje a gente consegue quebrar um pouco desse padrão, mas olha 2020 e a gente ainda está tendo que quebrar esse estereótipo. É pensar que a gente está até começando a ter representatividade, mas qual é a nossa representatividade mesmo? Você consegue pensar em uma serie, além de Sense 8, que trouxe uma lésbica trans? Eu nunca consegui ver, e se alguém puder me indicar eu vou ficar muito feliz. Por que, cadê as mulheres trans? As trans pretas?  As mulheres gordas? Eu sou uma mulher gorda e lésbica, e eu não me vejo hoje representada na televisão.”  

Beatriz de Lima Vieira

Beatriz reitera, para que haja visibilidade é preciso trazer a luta para representar a mulher lésbica na mídia, de forma fluída, natural e mais bem abordado para que seja uma representação mais fiel. 

Diferentemente, para Juliana, a representatividade lésbica na mídia do entretenimento vem melhorando. Como, por exemplo, quando ela buscava esse conteúdo em 2011 só conseguia encontrar conteúdos sexualizados e estereotipados, e atualmente ela encontra filmes onde o tema principal gira em torno de casais lésbicos. 

ESSE MEME E PIADA SÃO PRECONCEITUOSOS? 

Em discussões de internet e memes, as pessoas costumam dividir a mulher lésbica em raiz (aquela que não performa feminilidade) e nutella (aquela que performa feminilidade). Mas será que existe realmente um perfil de mulher lésbica?

Tainá afirma que os corpos lésbicos são plurais, ou seja, existem lésbicas mais femininas e lésbicas que não reproduzem feminilidade. Porém, não existe um perfil de lésbicas, é importante dizer que há diferentes vivências e atravessamentos e que são a partir deles que devem ser construídos os diálogos dentro e fora do movimento, conclui ela. 

Juliana acha que as pessoas fazem essa divisão entre mulher lésbica raiz e nutella por uma necessidade de colocá-las em caixas, até mesmo entre mulheres lésbicas pode ocorrer essa designação. “Eu, por exemplo, me visto de forma relativamente masculina, tenho cabelo curto e não tenho necessidade de me colocar num rótulo. Mas eu sinto que as pessoas de fora do meio, que são heterossexuais, ou que não tem essa discussão tão presente, acabam tendo a imagem de que eu quero ser homem, mas não eu não quero ser homem, estou muito satisfeita em ser mulher e ponto final. Não é porque eu tenho cabelo curto e que eu me visto de forma relativamente masculina que eu quero ser homem.” Para ela, é preocupante que essa rotulação possa excluir mulheres e colocá-las num estereótipo, e por fim perpetuando essa imagem vista por pessoas heterossexuais e LGBTQIA+. 

Para Beatriz, isso se deve ao fato de que as pessoas esperam um padrão de comportamento da mulher lésbica, que se assemelhe ao padrão de comportamento esperado para um homem, pelo fato de que elas se relacionam com uma mulher. E isso é uma forma preconceituosa de se pensar. “Quando eles veem duas mulheres se relacionando, eles vão esperar que uma delas acabe por assumir o papel que ‘teria que ser’ do homem, essa é a grande viagem deles pra falar que a lésbica tem que se comportar de tal maneira.” Ela também pontua: “Acho que a gente tem que quebrar isso, essa coisa do que é imposto pelos outros e a gente tem que reproduzir. Não existe ser uma lésbica raiz e uma lésbica nutella porque você tem que se sentir bem do jeito que você é.” Ou seja, para Beatriz, a mulher não vai ser mais lésbica ou menos lésbica pelo jeito que ela se veste, essa rotulação que a sociedade faz acaba por tornar invisível aquela pessoa que quebrou um padrão de comportamento estereotipado. “As pessoas são plurais, as mulheres são plurais, então a gente sempre vai encontrar uma mulher lésbica diferente, e tudo bem é normal ser diferente, é bom ser diferente, e isso é muito lindo. Acho que é algo que a gente que lutar pra que seja mais aceito.”    

Os @ mais indicados com conteúdo lésbico, vale a pena seguir:

https://www.instagram.com/p/CFZsIqcH6d_/
https://www.instagram.com/p/B92Y8Jtp3K5/

Representatividade importa: filmes e séries com personagens lésbicas

  • “Ek Ladki Ko Dekha Toh Aisa Laga”; 
  • “Elisa & Marcela”;
  • “Desobediência”; 
  • “Retrato de uma jovem em chamas”; 
  • “Feel Good”; 
  • “SEPTO”; 
  • “Você nem imagina”; 
  • “O mau exemplo de Cameron Post”; 
  • “A bela estação (la belle saison)”; 
  • “Generation Q”; 
  • “Flores Raras”; 
  • “RED”;  
  • “Pariah”; 
  • “Almas gêmeas”; 
  • “I am not ok with this”; 
  • “Ratched”.  

Representatividade importa: livros que você vai querer ter na sua estante:

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