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STOP ASIAN HATE: COMO A PANDEMIA INFLUENCIOU NO CRESCIMENTO DO RACISMO CONTRA ASIÁTICOS.

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Por Estephani Azevedo da Silva, Isabel Tavares Gonçalves e Juliana Farinati

O número de agressões contra asiáticos e seus descendentes cresceu muito depois da pandemia da COVID-19. Segundo o Departamento de Polícia de Nova  York, as agressões contra pessoas amarelas cresceram em 1.900% de 2019  para 2020 nos Estados Unidos. As denúncias envolvem agressões verbais,  físicas e outras formas de agressão racial. 

No Brasil, esse preconceito também aparenta estar aumentando. Segundo a criadora de conteúdo, atriz e fotógrafa Claudia Okuno, de 26 anos e moradora de São Paulo, ela consegue observar o aumento do ódio contra orientais até mesmo nos comentários de suas lives. “Não tem uma que não apareça gente me xingando, falando que não sou bem-vinda no Brasil ou me chamando de coronavírus/corona/SARS-CoV-2″. A ativista ainda acrescenta “Antes da  pandemia, as discriminações não eram tão frequentes nem tão agressivas”. 

Infelizmente, o preconceito contra asiáticos já era uma questão antes mesmo da  pandemia da COVID-19. Desde crianças, descendentes e imigrantes sofrem com estereótipos e piadinhas. ‘’Eu já passei por situações meio chatas, e acredito  que praticamente todo oriental já passou também. Quando criança, sempre que  eu ia em algum lugar onde não tivesse orientais, já chegavam tentando falar em  “chinês”, sabe? Ridicularizando o idioma chinês/japonês”. conta o estudante de  odontologia Fernando Yassuji Uema, 24 anos, de São Paulo. 

Já a modelo fotográfica, Yumi Morito, 23 anos e moradora de São Paulo, relata ouvir piadinhas e comentários como: “abre o olho”, “vai roubar minha vaga na faculdade”, “você deve ser boa em matemática”, “você é bonita para uma asiática”, também tem alguns que fazem gestos, normalmente são relacionados  ao estereótipo.“

Juliana Yuki, de 22 anos e moradora de São Joaquim – SC, também relatou um  pouco de suas próprias experiências em relação a preconceitos; “As experiências difíceis que eu tive e ainda tenho são aqueles comentários que as  pessoas fazem quando veem asiáticos “abre o olho japonesa”, “asiáticos são  todos iguais”, “pastel de flango”, “xing ling”. Mas não tive experiências realmente  difíceis, comparado com o que asiáticos no mundo inteiro estão passando.” 

“O preconceito contra a minha etnia é feito basicamente de micro agressões, então os meus maiores sofrimentos foram na infância, enquanto eu não compreendia o motivo de ser tratada daquele jeito e não tinha recursos para elaborar as situações. Por exemplo: na época da minha infância, Star Wars estava em alta e as outras meninas não deixavam eu ser a princesa Leia porque ela não era japonesa – portanto eu também não poderia brincar de nada, uma  vez que a única asiática da mídia infantil era a Mulan e ninguém queria brincar  de Mulan.  

Vivi outras violências mais maldosas ao longo da adolescência e vida adulta mas  infelizmente é algo tão comum que a gente acaba se acostumando, que vão  desde a fetichização ao ódio mesmo. “ Cláudia Okuno. 

Este ambiente de piada e o tratamento diferenciado para com os descendentes de orientais desde criança pode vir a afetar a forma como eles se enxergam e a forma com a qual enxergam o país onde vivem. “O ser humano é um animal evolutivamente social, a coletividade permitiu a sobrevivência da espécie, então  querer integrar o grupo é uma necessidade natural do ser humano. O sentimento  de pertencimento é valioso para a nossa espécie, mas, no caso dos brasileiros  amarelos, existe uma falta de acolhimento enorme, uma vez que somos asiáticos  demais para sermos brasileiros e brasileiros demais para sermos asiáticos. Se  nós mudássemos para algum país da Ásia, não faríamos parte da sociedade lá  também.” diz Okuno. Enfatizando a fala de Cláudia e mostrando como é  problemática a falta de acolhimento, Morito comentou. “Me sinto muito confusa. Para alguns assuntos não tenho lugar de fala “porque sou asiática” e em outros, também não “porque sou brasileira”, estando nessa situação, parece que não  tenho nenhum lugar de fala.”

Recentemente, tendo em vista os inúmeros casos de racismo e xenofobia que a comunidade asiática tem sofrido desde o início da quarentena, em março de 2020, a campanha StopAsianHate teve destaque nas redes sociais e nos Estados Unidos. O movimento ganhou mais força após um ataque a três casas de massagem na Geórgia, onde oito pessoas foram mortas, sendo seis delas mulheres asiáticas. 

“Embora o movimento StopAsianHate tenha ganhado mais atenção da mídia, há  uma falta de análise do porquê estes atos de violência estão acontecendo em  um nível elevado, e sobre como podemos chegar à raiz do problema. Há mais  esperança à medida que mais membros da comunidade asiática percebem que  nossa luta está ligada aos nossos irmãos negros, indígenas, latinos e globais…“  diz a atriz e ativista norte-americana Carolina Kaydo, 28 anos, através de uma  troca de mensagens pelo instagram. 

Kaydo cresceu como uma jovem descendente asiática nos Estados Unidos e  relata sobre o constante racismo que ela e seus amigos sofrem em seu próprio  país. “Não tem nenhuma experiência particular tão grande quanto o sentimento  constante de estar sob ataque como uma mulher asiática na América. Hoje  mesmo gritaram para uma amiga minha na rua, mandando ela “voltar para o seu  país”. Se não somos atacados individualmente, temos o constante ataque  sancionado pelo estado que ameaça nossa casa, nossas possibilidades de  ganhar um salário mínimo, acesso a plano de saúde.” 

O médico cardiologista Nori Bekki, 34 anos, com quem conversamos por mensagens em redes sociais, é japonês residente em Tokyo e, antes da  pandemia, costumava fazer diversas viagens internacionais para América e a  Europa. Ele relata que diversas vezes sofreu ataques durante suas viagens. “Eu tive uma experiência onde um cara bateu no táxi em que eu estava com um guarda-chuva“, conta Nori, o entrevistado ainda completa; “Pessoas ocidentais  já me disseram: “Chinês de merda”, quando eu estava andando nas ruas, apesar de eu ser japonês. “ 

Embora o Brasil seja um dos países com um grande número de imigrantes e colônias asiáticas, o movimento Stop Asian Hate não teve um grande impacto entre os brasileiros, e sequer teve destaque em grandes veículos de notícias. O programador Célio Yutaka, de 24 anos, mora em Sorocaba – SP, acredita que a diversidade étnica e o contexto econômico de crise que o país vivencia podem ser fatores para que o movimento não tenha tanto impacto no Brasil. 

“De fato, aqui no Brasil não há tanta visibilidade quanto outros movimentos tiveram, acredito que isso ocorra devido à falta de conhecimento sobre, muita gente não sabe o que está acontecendo e muito menos que o movimento existe.“, Yumi Morito comenta sobre o assunto. 

Frente a isso, o sociólogo Vitor Alessandri,professor de Relações Internacionais  na ESPM de Porto Alegre, comenta a respeito do aspecto sociológico da questão: “A sociologia nos ensina que os diferentes podem conviver bem juntos.  De todo modo, na prática, o que estamos vendo hoje em dia, é que os diferentes  estão se odiando e estão levantando voz de ódio contra os outros. Potencializados por essas ferramentas de redes sociais, que criaram bolhas”. Além disso, Alessandri faz alusão ao conceito de “laços de solidariedade orgânica” proposto pelo sociólogo Émile Durkheim; afirmando que, por meio dessas ferramentas potencializadoras de bolhas algorítmicas, esses laços estão  sendo dissolvidos, de forma a interferir no desenvolvimento de relações de  respeito e sociabilidade entre os diferentes.